Na Evocação de Lopes-Graça em Dezembro de 2009, inserida na programação da Casa Memória Lopes-Graça, está incluída uma audição comentada (5 de Dezembro, 17 horas, Auditório Lopes-Graça) com duas obras, para violino e piano, de Lopes-Graça, a saber: A Sonatina nº 1 e o Pequeno Tríptico.
Curiosamente, são duas obras com fortes ligações a Tomar.
Acontece que, faz agora precisamente 50 anos, Tomar foi palco das duplas comemorações – as do Infante D. Henrique e as da fundação de Tomar.
Estas comemorações tiveram então enorme repercussão a nível nacional, com a presença do presidente da Republica, vários Ministros e uma programação que se espalhou ao longo do ano e onde se incluiu uma Festa dos Tabuleiros.
Em plena ditadura, às portas da guerra colonial, a escolha do cidadão para Director da Comissão responsável pela organização de tais Comemorações, recaiu em António Antunes da Silva, ex -candidato do Movimento de Unidade Democrática por Santarém e velho amigo de Fernando Lopes-Graça.
Por outro lado, o jornal O Templário de então, sob a direcção de outro amigo do compositor - Fernando Araújo Ferreira, na sua secção “Anotando” deixava registado: À Comissão das comemorações henriquinas lembramos a colaboração de um grande artista tomarense – um filho de Tomar, na sua terra, a dizer do Infante através da sua arte. Trata-se de Fernando Lopes Graça.
Pareciam estar reunidas as condições para a presença de Lopes-Graça e da sua música na sua terra natal. È assim que se inicia uma correspondência com Aquiles da Mota Lima, membro da dita Comissão e um dos irmãos Mota-Lima responsáveis pela introdução de Lopes-Graça na prática da música de câmara para, em conjunto com o compositor tomarense, organizar um concerto a realizar, no Cine-Teatro, só com obras de Lopes-Graça.
Para esse concerto acerta-se a colaboração do violinista Augusto da Mota-Lima, para tocar algo que não fosse muito transcendente, uma vez que já não se encontrava muito bem de saúde.
Pela correspondência trocada ficamos a saber que a escolha recaiu no Pequeno Tríptico, o qual seria executado por Augusto Mota – Lima ao violino e Lopes-Graça ao piano.
Teria sido, com toda a certeza um concerto de alta qualidade e recheado de afectividade.
Tal acabou por não acontecer porque, em Abril, é comunicado a Lopes-Graça que o concerto teria que ser adiado para a semana seguinte uma vez que na data acordada se tinha de realizar, naquela sala, um outro concerto, com o Orfeão do Colégio Nuno Álvares.
Esta desfeita tomarense ao seu conterrâneo compositor mereceu do mesmo uma resposta amarga, dirigida a Aquiles, que aqui se deixa:
Vai esta sem as Excias protocolares para manter o caracter íntimo e, apesar de tudo, amigável, ao ter de lhe comunicar o quanto lamento (e o lamento não vai sem certa surpresa...) não se ter compreendido aí o que lhe expus na minha anterior carta, quanto à impossibilidade de transferir a data do concerto em Tomar. Esta data (1 de Maio) estava há já meses marcada por si próprio e eu não posso deixar de achar muito estranho que os grupos a que se refere não possam alterar, para não dizer não possam cumprir o seu calendário de actuações e se entenda por bem impor essa alteração a pessoas que, como profissionais de música que são, têm também os seus compromissos e estes também muito mais sérios, por sua natureza própria inflexíveis, do que os compromissos dos grupos amadores...É sempre a mesma história em Portugal... O amador é que é o artista respeitado, a quem tudo se pode consentir, o profissional não passa de um “chato”, que se subordine se quiser, senão quiser, adeus que se passa muito bem sem ele ...Que tristeza!!! Pois meu caro Aquiles de Lima, terão de facto de passar sem nós, isto é, sem o concerto, o que porventura irá ao encontro de desejos escondidos aí entre os salgueirais do Nabão. Tenho pena. E , estou certo que você, pessoalmente, também, apenas se vendo logrado na sua boa vontade. Mas assim talvez seja melhor: não “chatearemos” ninguém. A minha terra, à qual sinceramente acedi em dar um prova de referência ( e perdoe-me a imodéstia de dizer que não preciso dos possíveis louros que nela iria colher), a minha terra continua, ao que parece, o que dantes era... Não quero deixar de agradecer a generosidade da proposta para o concerto, na alternativa, se realizar em Novembro, em “fim de festa”. Será melhor, desde já não contarem com tal, porque nem eu nem os meus colaboradores podemos assegurar nada para essa altura, nem correr os riscos de outro possível adiamento, que de modo nenhum convém a gente que tem a sua vida profissional organizada. Queira aceitar, meu caro Aquiles, com as minhas amigas saudações, os meus agradecimentos pela boa-vontade manifestada por si na realização de um empreendimento, por ventura de antemão condenado ao fracasso. Seu
Curiosamente, é a Sonatina nº 1 para violino e piano de Lopes-Graça que tem uma dedicatória a Augusto da Mota –Lima, concluindo-se que o compositor a considerava uma obra muito mais transcendente que o tríptico.
Ora no dia 5 de Dezembro, pelas 17 horas, serão estas duas obras as apresentadas, pelo duo Dópio, evocando Fernando Lopes-Graça e, porque não, os irmãos Mota-Lima e as comemorações henriquinas de 1960.
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